Um blog em todos os sentidos, com umas coisas escritas por Leonardo Vinhas. Tudo que representa o presente e reflete o passado, sem vaticínios futuros.

Saturday, December 09, 2006

Leituras recentes

Nunca li tanto quanto esse ano, e várias razões, do desânimo com o trabalho ao prazer da leitura, contribuíram para isso. O fato de eu ter ido morar sozinho, i.e. sem amigos ou namorada, ajudou também. Listar o que eu li esse ano seria arroto de erudição inútil, mas recentemente me caíram esses na mão:


ZERO - Ignácio de Loyola Brandão

Fazia uma cara que eu tinha vontade de ler esse livro, mas sempre deixava para depois. Encontrei-o baratinho (R$ 5,00) num sebo em Londrina e o levei. Como "Não Verás País Nenhum", é um livro apocalíptico, que começa devagar, tem um desenvolvimento poderoso e um final cansado e cansativo. Parece que Loyola desenvolvia a idéia, se entregava a ela como um junkie obcecado, escrevendo nu (ele de fato o fazia) sob inspiração subconsicente e febril, deixando tudo que vinha à mente tomar forma no papel, mas depois se cansava e lhe faltava pique para manter o envolvimento no final. De qualquer forma, a alegoria nada sutil às ditaduras da "América Latíndia" e as seqüências de sexo com fezes e espancamento devem ter incomodado os editores, que rejeitaram a obra por 06 anos, publicaram em 1975 e capitularam à censura do governo militar pouco depois. Ainda hoje, a falta de pudor e a crueza política impressionam, e a lua-de-mel de José com Rosa é para ser relida à exaustão - ódio, nojo, paixão e despudoramento explodindo em sons e palavras, o gozo de transar apaixonadamente com raiva, "amo Rosa porque é gorda, vou encher essa gorda de porradas, olha o umbigo de Rachael Welch, como é gostosa minha mulher, porraaaaaaaa". Mas o final, com toda a coisa macumbeira e messiânica, é anti-climático. De qualquer forma, se eu tivesse lido com 16, estaria nam inha lista de melhores de todos os tempos.


O CLUBE DOS ANJOS - Luis Fernando Veríssimo

Sou fã assumido do Veríssimo cronista, mas nunca tinha lido seus romances. Encontrei esse a R$ 15,00 no mesmo sebo londrinense e o levei para casa. Críticos da VEJA e afins reclamavam do fato de ele ter a "classe média alta decadente" como personagens-fetiche de seu mundo. Besteira da grossa. Fico imaginando quem dá trela a esse tipo de resenha. O livro segue o mesmo estilo ágil, crítico e algo metalingüístico de Veríssimo, que não tem obrigação de falar dos desdentados do Nordeste para se disfarçar de literário. A história é tão inverossímil quanto engraçada, dez filhinhos de papai meio velhos e muito decadentes morrendo pela própria gula, narrada por um gordinho metido a escritor e vazio como a maioria deles. Li quase numa "sentada" só, e voltei pra casa ligeiro depois do trampo para terminar o que faltava. Divertidíssimo.

A MESA VOADORA - Luis Fernando Veríssimo

Dessas coletâneas de crônicas do LFV que a Editora Objetiva vem editando, essa é a mais pitoresca. O gaúcho destila memórias gustativas e associações culinárias em textos curtos que, ainda que às vezes são um pouco pessoais, divertem como uma boa cervejada num fim do dia. Muitas abobrinhas (não no sentido físico) dignas de serem conversadas numa mesa de bar, mas sem erudição xarope. Veríssimo, ele mesmo assume, não é um gourmet, só um comilão. E consegue divertir até quando fala de um canard qualquer coisa, um prato impenetrável ao mundo dos simples assalariados. Bobinho em uns poucos momentos, divertidíssimo e outros.

ATÉ MAIS, E OBRIGADO PELOS PEIXES - Douglas Adams

O último volume da "trilogia de quatro livros" iniciada pelo ótimo Guia do Mochileiro das Galáxias é infinitamente superior ao terceiro tomo, A Vida, O Universo e Tudo Mais, e quase tão bom quanto o insuperável O Restaurante no Fim do Universo. A saga de Arthur Dent é encerrada de uma maneira, ahn, feliz (não necessariamente), sem perder o cinismo e a acidez que tanto seduzem na obra de Adams. Na verdade, ele não cai na tentação fácil da tragédia, assim como não se capitula a um finalzinho tolo para agradar fãs chorões. Adams termina sua saga como a começou: com um monte de interrogações pertinentemente absurdas, muito humor e o romance mais desajeitado de todos os tempos, não deixando de contemplar jornalistas aduladores, camelôs interplanetários e até um insuspeito deus adorado pela chuva - você leu certo, não é o cara que adora a chuva, mas exatamente o contrário. Virando vários de seus conceitos ao avesso, e mantendo portanto sua lógica desconcertante, Adams sacaneia até o leitor que foi suficientemente estúpido para acreditar que Arthur e Trillian teriam algum romance, ou suficientemente "fanboy" para esperar que a série repetisse sua própria mitologia. Dica: faça uma trilogia de fato, pule o número três, compre os demais e tenha a melhor saga literária dos últimos tantos anos.

1 Comments:

Blogger André said...

Num sábado de extremo mau humor e dinheiro no bolso (geralmente é o contrário) em São Paulo ano passado, fui até a Fnac e esbanjei 50 reais no volume 3 e 4 do Guia do Mochileiro... comecei a ler o 3 e o mau humor piorou, achei infinitamente sem graça, muito abaixo do 1 e do 2. Mas depois dessa dica sua pode ser que eu parta direto pro 4 mesmo. Qual seu preferido? Dos dois que li, é o segundo.

2:16 AM

 

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