Um blog em todos os sentidos, com umas coisas escritas por Leonardo Vinhas. Tudo que representa o presente e reflete o passado, sem vaticínios futuros.

Monday, March 26, 2007

Filmes do fim de semana

Circunstâncias inevitáveis me mantiveram limitado ao aconchego/claustro do lar por uns dias, e provavelmente me manterão por um tanto mais. A saída foi recorrer aos filmes, todos gratas surpresas. A eles, na ordem em que foram assistidos:


GERAÇÃO PROZAC (Prozac Nation, 2001). Elizabeth Wurtzel é uma escritora e jornalista que começou com um artigo na revista adolescente Seventeen (quando tinha 16, ironicamente), passou pela Rolling Stone e cravou um best-seller nas paradas literárias mundiais. Nesse caminho, neuroses, psicoterapia, drogas, rock’n’roll du bão, solidão, comportamentos obsessivos e auto-destruição foram companheiros constantes. É bem esse caminho que ela abordou no livro Prozac Nation, no qual esse filme se baseia. Autobiográfico, mas sem autopiedade, seu texto ilustra a relação de amor e ódio dela com seus pais, sua ansiedade e os nada saudáveis “ansiolíticos” usados para aplaca-la, sua crueldade para com os que se aventuravam a ser seus amigos, sua paixão pela poesia e sua neurose doentia pela busca da originalidade. Christina Ricci é uma das produtoras e dizer que ela protagoniza o filme é injusto – ela o leva com os pés nas costas, isso num elenco que ainda conta com Anne Heche, Jonathan Rhys-Myers e Jessica Lange (excelente como a mãe cuja aparência lembra a de um vaso que já foi muito sólido e agora está irremediavelmente rachado). Na verdade, até Jason Biggs, o pie-fucker do infame American Pie está bem aqui, como o bom moço judeu que é tiranizado pela paixão possessiva e dependente de Lizzie. Não havia ouvido nada sobre o filme, nem seu diretor, o sueco Erik Sondjerberg, mas ambos já entraram em lugares privilegiados em minhas listas de referenciais. Um filme que escapa do dramalhão clichê com muita agilidade, inteligência e excelentes atuações, além de soluções muito criativas na montagem.


Oh, my!


Adendo para o Boi: a guria do filme é fã do Bruce Springsteen (que tem duas canções na trilha), tem um pôster do Joy Division e outro do Velvet Underground no carro e uma paixão devocional pelo Lou Reed, que aparece no filme mandando trechos de “Sweet Jane” e “Perfect Day” ao vivo. Assista sem surtar, se puder.



A verdadeira Lizzie Wurtzel


XEQUE-MATE (Lucky Number Slevin, 2006). Lembra daquilo que chamavam de “filme independente” no começo dos anos 90? Aquela explosão pós-Pulp Fiction em que filme independente era sinônimo de uma obra inteligente, despretensiosa, algo intrigante? Então, hoje não é bem assim, mas esse Xeque-Mate traz o mesmo espírito, o mesmo humor e a mesma sagacidade, sem aquele gosto de revival requentado. Josh Hartnett vive um cara que está se fodendo muito num jogo armado entre dois chefões rivais de Chicago, o Rabino (Ben Kingsley) e o... hããã, Chefe (Morgan Freeman, deixando de lado o papel de “velho amigo” e “guru do bem” que vinha repetindo havia tempos)... e parece não estar nem aí. Nem ele, nem uma médica legista linda, avoada e fã do Columbo (Lucy Liu, apalermadamente sexy que só ela) que acaba se envolvendo (se inserindo ou se enjeitando talvez sejam mais apropriados) na história. E ainda tem um matador muito-fodão-e-assustador vivido por Bruce Willis, o cara perfeito pro papel. Todo personagem tem sua importância na trama sem que se recorra àquele chavão de “histórias paralelas que se cruzam” que virou clichê nos filmes-independentes-que-seguem-fórmulas-mas-tentam-parecer-cool. O humor meio absurdo, quase de um comic book de Garth Ennis (só que mais refinado e com melhores diálogos) permeia quase todo o filme, abandonando-o no final, porque, afinal de contas, um fim a esbórnia toda precisava ter, e dificilmente seria na base da galhofa.
Dois dias depois de tê-lo assistido, tenho a sensação de que alguma coisa poderia ter sido melhor. Mas como não sei o que é, e na hora ainda me diverti pra caralho, dane-se.


Porque não achei uma foto decente da Lucy Liu no filme.



ERASERHEAD (1976). Tudo que você sabe sobre os filmes de David Lynch é falso, a não ser que você os tenha visto. Seus fãs são chatos e não ajudam a dar informações corretas, os críticos (fãs ou não) e os detratores repisam sempre os mesmos chavões para falar dele, e a maioria provavelmente não assistiu mais que Mullholland Drive e uns episódios de Twin Peaks. Eu também não sou um expert no homem, e dou parte da razão à minha amiga Larisse, que já me contou não assistir mais aos filmes de Lynch para não se sentir burra. Mas cara, esse Eraserhead não será facilmente eliminado de sua memória (achou que eu ia usar um trocadilho fácil, hein?)
Para evitar falsas impressões, vou tentar fazer uma descrição factual do filme com mínimo possível de adjetivos deturpadores em potencial. Henry Spencer, um homem com penteado “A Flock of Seagulls afro”, vive sozinho em remoto subúrbio industrial onde há ruídos intermitentes. É intimado pela mãe da namorada a se casar com ela, pois da união deles veio um bebê mutante assemelhado a um verme cruzado com um coelho pelado que está sempre enrolado em bandagens; O bebê chora o tempo todo, enlouquecendo a mãe, que vai embora, deixando o pai sonhando com uma moça de bochechas deformadas que vive dentro de um aquecedor, cantando canções sobre o céu num palco infestado de vermes que ela esmaga candidamente. A vizinha tenta seduzir Henry.O bebê fica doente, coberto de pústulas horríveis. Uma árvore sangra. Um homem cheio de cicatrizes (Deus?) puxa algumas alavancas.
Sonhos se multiplicam e se fundem à realidade, abrindo espaço para várias interpretações. Eu gostei da teoria religiosa, mas admito que quando vi, pensei que tudo estava ligado à repulsa à paternidade e aos valores familiares. Não explico nem as teorias nem detalho minhas impressões para não estragar o prazer de quem vai se aventurar nessa que é, provavelmente, a maior e melhor piração lyncheana; Mas repito aqui a colocação que meu amigo André ZP fez quando me avisou que me passaria o filme: indispensável. Não é para você, que gosta de linearidade. Mas se quiser aproveitar as horas do seu cérebro que não foram atrofiadas pelas canções de ninar televisivas e embusteiros profissionais, é a melhor pedida. Um filme que não será apagado de sua cabeça tão facilmente (é, não resisti...).


Ah, sim! A "cena do frango" é um dos três melhores momentos do cinema, não importam quais sejam os outros dois.




Um cara comum.




OS INFILTRADOS (The Departed, 2006). Provavelmente o único leitor desse blog que ainda não havia visto esse filme era eu mesmo. Não assisti a todos os filmes de Martin Scorcese, mesmo o famosíssimo Touro Indomável ainda não encontrou uma oportunidade para brilhar numa telinha à minha frente. Mas o que vi dele é o suficientemente para me dar boas esperanças, já que é um cara que já deu bolas fora (Gangues de Nova York, que achei falhado e cheio de clichês) em meio a pérolas como Taxi Driver e isso só aumenta a credibilidade dele. Esse Os Infltrados não é Os Bons Companheiros, mas poderia ser, já que é tão bom quanto. Parece-me que o roteiro foi adaptado de algum filme chinês ou coreano, mas ficou tão “ítalo-americano” (desculpe, correção política não é meu forte) quanto poderia ser. DiCaprio numa atuação furiosa, Jack Nicholson fazendo tudo o que se espera dele e mais um pouco, Matt Damon achando o papel perfeito para sua irritante cara de primeiro da classe e até o gorducho Alec Baldwin tendo a chance de dizer “presente!” sem fazer feio. Amarrando essas e outras interpretações fortes, um roteiro sem supérfluos ou truques, chegando rapidamente ao caminho sem usar linhas retas. Quem regeu tudo isso? O velho ex-seminarista que sabe fazer um “filme de macho” que pode ser apreciado pelas mulheres também. O Oscar foi de consolação, como disseram? Maldade pura de quem o disse. Scorcese já havia gravado seu nome na história do cinema. Esse filme (e seus prêmios) só veio trazer os ornamentos à placa de homenagem.

3 Comments:

Blogger André said...

Sabia que ia gostar de ERASERHEAD, e só o fato de 90% dos fãs de Lynch não terem assistido já explica o porque dele ser tão bom. In Heaven, everything is fine.

Também adorei OS INFILTRADOS, a edição é maravilhosa, você termina o filme e não acredita que se passaram quase três horas. Os chatonildos reclamam que TAXI DRIVER tinha que ter ganho o Oscar no lugar dele, mas não consigo imaginar um filme mais anti-Oscar que TAXI DRIVER.

10:03 AM

 
Anonymous Anonymous said...

hummm, vou dar uma conferida. e a vida, seu Léo, como estás? abraço, maluco.

10:17 PM

 
Anonymous Anonymous said...

Lizzie Wurtzel = justa causa da patrôa. Melhor eu assistir sozinho. =)

Abração!

6:50 PM

 

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