Um blog em todos os sentidos, com umas coisas escritas por Leonardo Vinhas. Tudo que representa o presente e reflete o passado, sem vaticínios futuros.

Thursday, May 17, 2007

Sobre coerência e sobre muitas coisas que, na real, não importam

Autoramas lançando disco novo. Quando eu morava no tramo Taubaté-Campos do Jordão, levei minha então namorada a um show do trio (ainda com Simone no baixo) em São José dos Campos. Lá pela quinta ou sexta música, ela me perguntou: “eles tocam sempre a mesma música? A batida não muda”. Convém destacar que ela não era exatamente uma xaropinha fã do baticum aeróbico das “baladas”, e sim uma musicista que sacava muito bem música e tocava vários instrumentos.
Gosto muito do segundo disco do Autoramas, apesar (ou por causa) de ter várias composições que não são do trio e de ser um disco preterido pela banda (e da voz do Gabriel ser meio estridente demais, também). O primeiro não me empolgou muito na época e não o faz até hoje, mas ainda está na prateleira. O terceiro foi pro sebo há muito tempo. A banda havia gravado queixumes e choradeiras demais, e não bastasse a auto-repetição, constatei que o som deles era uma grande chupação de um sem-número de bandas indies obscuras e meio sem graça – aquelas bandas que fazem duas musiquinhas legais e não segura a onda no resto do disco.
Disco novo, então. Vi de relance uma letra que me agradou, “Marketeiro”. O resto me pareceu, sonora e liricamente, mais do mesmo, sendo que o “mesmo” não significa o pop desencanado do segundo disco, mas sim a falta de empatia do primeiro misturada com a pouca qualidade do segundo. O discurso deles continua a xaropada de sempre, mais chato que minha ranhetice contra nada específico. E sobre o discurso...
Após o tal show em São José dos Campos, fui entrevistar a banda para um site que nem existe mais. Veio todo o discurso anti-tudo do Gabriel: anti-gravadora, anti-medalhões, anti-imprensa, mais o blábláblá mercadológico que parece ter tomado conta das já restritas discussões sobre música nesse país – sobrou até para Deus e para a finada revista General, que só tinha entrado na conversa de relance. Tudo muito “rebelde”, “autêntico” e “contundente”, só que quando foi para dizer EXATAMENTE o que havia rolado entre Autoramas e sua grande gravadora que os dispensara (me esqueci se era a Virgin ou a Universal e não estou com o material em mãos para checar), Gabriel pediu para desligar o gravador. Quando foi para citar também uns nomezinhos graúdos do metier musical e da imprensa que o acompanha, continuou o depoimento “off the record”.
Ninguém é obrigado a ser sincero. Acredito mesmo nisso. Cada um se reserva o direito de mentir, ou omitir fatos, o quanto quiser. Principalmente se for durante uma entrevista para um site pé-de-chinelo que nunca foi pra frente e morreu logo depois de começar. Mas aí vem a tal da “coerência” e – rufem os tambores – da “atitude”, aquela palavra tão maltratada desde que entrou no discurso dos “manos roqueiros” pós-Charlie Brown Jr. Como diz o ditado em inglês, “talk is cheap”. Falar é fácil e não custa nada. Mais difícil é ter pose de durão e sustentar a pose com atos coerentes. Há bandas (e atores, escritores, artistas plásticos, professores, vendedores e todo o tipo de profissional) que fazem isso muito bem, e outras que descambam para a putaria, assumindo sua promiscuidade numa boa e sem afetações. Respeito os dois casos, como também respeito a capacidade de criar uma boa e divertida mentira, como as “brigas” dos irmãos Gallagher, por exemplo. Só tenho uma bronca contra panfletarismo, seja ele qual for.
E naquela inesquecível noite joseense gelada, eu me dei conta que o som da banda, em geral, me incomodava tanto quanto esse panfletarismo em questão. E percebi que isso não era exclusivo dos Autoramas, mas sim um sintoma manifestado pela maior parte do meio “indie” em que eu me encontrava – o mesmo povinho que depois criaria o rótulo do “underground do underground” para excluir as crianças que não eram bem-vindas no seu playground. Um povinho tão esnobe quanto o pessoal que trabalhara comigo no escritório de uma multinacional ou as gurias que cursavam faculdade particular em Taubaté – o tipo de gente que se reserva o direito não de ficar na sua, mas de vilipendiar e menosprezar os outros, que não compreendem seu modo superior de vida e não têm condições de compreender sua complexidade e poder. Gente oca, cansativa e irritante.
A partir daí, comecei a me desvencilhar do “meio” até me dissociar totalmente disso, já há um tempo. Não me fez qualquer falta, como não me faz falta o ambiente de fábrica ou de faculdade. A música e tudo o que há cerca ainda me acompanham como uma questão vital, e não nego que sinto falta de ver bons shows, mas hoje em dia prefiro ficar no fundo do bar vendo o show quietinho – ou se é uma banda com esse poder, me acabar discretamente num espaço onde não vá incomodar ninguém.
Escrevi tudo isso meio que para me justificar perante as pessoas que às vezes me vêem nos raros shows que presencio ou entram em contato via internet e me perguntam porque parei de escrever. Também me perguntam porque não aceito mais receber material de bandas – e eu digo que não acho justo o camarada gastar uma grana de correio para enviar um material de divulgação que não será divulgado, já que não estou mais na área. Até acontece de ter quem insista para que eu fique com o material mesmo assim (como aconteceu recentemente), e eu agradeço muito a consideração, mas deixo claro que o maior espaço onde ele poderá vir a ser comentado é este blogue.
Não parei de escrever só por causa disso, mas as outras razões já foram mais que detalhadas aqui, no Ficção Autobiográfica e no Gordurama. Deixo a auto-repetição para os Autoramas e a incoerência para quem quiser. Eu não a quero.

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

isso me lembra uma história que me contaram sobre o Rubinho Troll, que foi vocalista do finada e clássica banda Sexo Explícito, de BH, nos anos 80, e foi morar em Londres depois que a banda acabou, se retirando do meio musical. Reza a lenda que ele lá ele gravava umas fitinhas caseiras com músicas dele e escrevia: "favor não fazer contatos para shows".

falando nisso, me passa teu endereço pra gente te mandar uns lances. to pouco me lixando se vai ser divulgado ou não. o que importa é que sei que bons ouvidos ouvirão, mesmo que seja para dizer verdades incômodas. e e aí que é mais legal ainda. porque de tapinha nas costas o inferno tá cheio. abs

11:48 AM

 

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